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A praça da (con)fusão
Marta Bernardo
2015
#investirnobairro
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A praça da (con)fusão
Marta Bernardo
2015
Artigo retirado da edição 9 do Jornal Rosa Maria. Esta edição poderá ser consultada na íntegra aqui.
#investirnobairro
#históriadoterritório
#mundonamouraria



Registos fotográficos da Praça Martim Moniz
Chama-se Mercado de Fusão. Ocupa a praça do Martim Moniz desde 2012 com quiosques de comida internacional, esplanadas, uma feira alternativa e eventos regulares.
A velha praça do Martim Moniz, hoje, está a cargo da NCS – Número de Ciclos por Segundo, empresa privada de José Filipe Rebelo Pinto, responsável pelo festival Outjazz (concertos nos jardins da cidade), pelo Faktory Club (na LX Factory) e pelo Topo, o novo bar no terraço do Centro Comercial Martim Moniz. O Mercado de Fusão é a terceira tentativa de reanimação desta praça que nasceu torta e que com dificuldade se endireitou. Foram 74 anos de avanços e recuos, 19 presidentes de câmara, dezenas de planos e dezenas de críticas.
Pensou-se em fazer uma praça, comércio, empresas, habitação. Abriu-se e fechou-se ao trânsito, mudou-se o nome e a atracção. Construiu-se, destruiu-se, desenhou-se e apagou-se. Milhares de euros (e contos, em moeda antiga) gastos em planos, obras, demolições, indemnizações e expropriações.
// Os primórdios da “chaga urbana”
Imoral, perigosa, multicultural e cosmopolita. “Buraco”, “terra de ninguém” e “chaga urbana”. Já tudo lhe chamaram, na rua e na imprensa – como se pode ler, por exemplo, no jornal Público, em 1996 e 2001.
Quando, em 1938, Duarte Pacheco, presidente da câmara e ministro das obras públicas de Salazar, pediu ao arquitecto Faria da Costa que resolvesse o problema da pobre, suja e feia Mouraria, a solução foi demolir o Palácio do Marquês de Alegrete para aí fazer nascer o Largo do Martim Moniz. Mas estava longe de imaginar a saga que aí vinha. Nos vinte anos seguintes, mais demolições. A Igreja do Socorro, o Teatro Apolo e o Arco do Alegrete deram lugar ao Hotel Mundial e à estação de metro do Socorro. Dez anos depois, desmantelado o mercado da Praça da Figueira, coube ao Martim Moniz acolher uns pavilhões por uns provisórios 40 anos.
A partir dos anos 80, começam as missões de salvamento. Primeiro com o autarca Krus Abecasis (CDS). Abriu um concurso, ganho pelos arquitectos José Lamas e Carlos Duarte, que propunham comércio, cultura, habitação e estacionamento. Da sua proposta, saíram apenas duas obras que ainda hoje não caem no goto dos moradores: os centros comerciais Mouraria e Martim Moniz (este último concluído no mandato do socialista Jorge Sampaio).
// Reconquista falhada
Na década seguinte, um folheto da EPUL (Empresa Pública de Urbanização de Lisboa) prometia resolver de vez “o problema desta obra de Santa Engrácia” e “devolver à cidade o seu Martim Moniz”. Mas não devolveu.
É João Soares (PS) quem, em 1995, dá a volta à praça para “fazer dos cidadãos protagonistas do espaço” (indemnizando José Lamas e Carlos Duarte por ter rompido com o seu projecto). Usando o tema da reconquista cristã, a estação de metro passa a chamar-se Martim Moniz, como o cavaleiro sem cabeça; anuncia-se na revista Step-by-Step, da Associação de Turismo de Lisboa, que nascerão “46 quiosques que, à distância, parecem guaritas de um castelo medieval”. Mas o que nasceu foram as “gaiolas do Martim Moniz”, como ficaram conhecidas.
Alfarrabistas, antiguidades, artigos chineses – nada pegou, as vendas não cobriam a renda. Até que, dois anos depois, Santana Lopes (PSD) doa 36 desses quiosques a igrejas, que também não lhes deram uso. Finalmente, há três anos, já com a reabilitação da Mouraria em curso, o executivo do socialista António Costa e a EPUL assinaram o protocolo com a NCS para exploração da praça.
// Fundir gregos e troianos
Apesar da animação, três anos depois, alguns responsáveis e funcionários dos quiosques queixam-se do “esmorecimento” do projecto, da falta de policiamento durante os eventos e de falta de manutenção do espaço: as casas-de-banho estão fechadas; para usá-las, há que pedir nos quiosques a chave e o papel higiénico (comprado pelos próprios lojistas). Uns urinam a céu aberto, outros desfilam na praça de rolo de papel na mão. O ROSA MARIA tentou falar com a NCS e a câmara, mas sem êxito.
Alguns moradores elogiam: está melhor, mais activa e bonita, as pessoas convivem. Outros criticam: demasiado moderna, sem comida tradicional nem áreas públicas suficientes. Há tempos, puseram-se novos bancos, a música baixou e os moradores mai reticentes lá regressaram, apesar dos preços para turista. Numa praça tão multicultural, será difícil agradar a gregos e troianos, mas pode ser que à terceira seja de vez.
// História da Praça Martim Moniz
Pontos-chave da praça que homenageia o cavaleiro cristão que morreu entalado nas portas do castelo, em 1147, na reconquista de Lisboa aos Mouros.
1938 - Nasce o largo, com a demolição do palácio do Marquês do Alegrete.
1980 - Nesta década dá-se a primeira reabilitação, com o autarca Krus Abecasis, pai dos polémicos centros comerciais que ladeiam a praça. Seria concluída no mandato de Jorge Sampaio.
1990 - Década da segunda intervenção, sob o lema da Reconquista Cristã. Nasce o conceito de quiosques no mandato de João Soares – o autarca que, sobre o Centro Comercial Mouraria, chegou a dizer: “Vou implodi-lo”.
2012 - Inauguração do Mercado de Fusão, concessionado à NCS.
2017 - Transferência de concessão à empresa Moonbrigade Lda. por dívidas da antiga concessionária à Autarquia
2018 - Adenda ao contrato de concessão e alargamento do prazo por mais 14 anos.
A velha praça do Martim Moniz, hoje, está a cargo da NCS – Número de Ciclos por Segundo, empresa privada de José Filipe Rebelo Pinto, responsável pelo festival Outjazz (concertos nos jardins da cidade), pelo Faktory Club (na LX Factory) e pelo Topo, o novo bar no terraço do Centro Comercial Martim Moniz. O Mercado de Fusão é a terceira tentativa de reanimação desta praça que nasceu torta e que com dificuldade se endireitou. Foram 74 anos de avanços e recuos, 19 presidentes de câmara, dezenas de planos e dezenas de críticas.
Pensou-se em fazer uma praça, comércio, empresas, habitação. Abriu-se e fechou-se ao trânsito, mudou-se o nome e a atracção. Construiu-se, destruiu-se, desenhou-se e apagou-se. Milhares de euros (e contos, em moeda antiga) gastos em planos, obras, demolições, indemnizações e expropriações.
// Os primórdios da “chaga urbana”
Imoral, perigosa, multicultural e cosmopolita. “Buraco”, “terra de ninguém” e “chaga urbana”. Já tudo lhe chamaram, na rua e na imprensa – como se pode ler, por exemplo, no jornal Público, em 1996 e 2001.
Quando, em 1938, Duarte Pacheco, presidente da câmara e ministro das obras públicas de Salazar, pediu ao arquitecto Faria da Costa que resolvesse o problema da pobre, suja e feia Mouraria, a solução foi demolir o Palácio do Marquês de Alegrete para aí fazer nascer o Largo do Martim Moniz. Mas estava longe de imaginar a saga que aí vinha. Nos vinte anos seguintes, mais demolições. A Igreja do Socorro, o Teatro Apolo e o Arco do Alegrete deram lugar ao Hotel Mundial e à estação de metro do Socorro. Dez anos depois, desmantelado o mercado da Praça da Figueira, coube ao Martim Moniz acolher uns pavilhões por uns provisórios 40 anos.
A partir dos anos 80, começam as missões de salvamento. Primeiro com o autarca Krus Abecasis (CDS). Abriu um concurso, ganho pelos arquitectos José Lamas e Carlos Duarte, que propunham comércio, cultura, habitação e estacionamento. Da sua proposta, saíram apenas duas obras que ainda hoje não caem no goto dos moradores: os centros comerciais Mouraria e Martim Moniz (este último concluído no mandato do socialista Jorge Sampaio).
// Reconquista falhada
Na década seguinte, um folheto da EPUL (Empresa Pública de Urbanização de Lisboa) prometia resolver de vez “o problema desta obra de Santa Engrácia” e “devolver à cidade o seu Martim Moniz”. Mas não devolveu.
É João Soares (PS) quem, em 1995, dá a volta à praça para “fazer dos cidadãos protagonistas do espaço” (indemnizando José Lamas e Carlos Duarte por ter rompido com o seu projecto). Usando o tema da reconquista cristã, a estação de metro passa a chamar-se Martim Moniz, como o cavaleiro sem cabeça; anuncia-se na revista Step-by-Step, da Associação de Turismo de Lisboa, que nascerão “46 quiosques que, à distância, parecem guaritas de um castelo medieval”. Mas o que nasceu foram as “gaiolas do Martim Moniz”, como ficaram conhecidas.
Alfarrabistas, antiguidades, artigos chineses – nada pegou, as vendas não cobriam a renda. Até que, dois anos depois, Santana Lopes (PSD) doa 36 desses quiosques a igrejas, que também não lhes deram uso. Finalmente, há três anos, já com a reabilitação da Mouraria em curso, o executivo do socialista António Costa e a EPUL assinaram o protocolo com a NCS para exploração da praça.
// Fundir gregos e troianos
Apesar da animação, três anos depois, alguns responsáveis e funcionários dos quiosques queixam-se do “esmorecimento” do projecto, da falta de policiamento durante os eventos e de falta de manutenção do espaço: as casas-de-banho estão fechadas; para usá-las, há que pedir nos quiosques a chave e o papel higiénico (comprado pelos próprios lojistas). Uns urinam a céu aberto, outros desfilam na praça de rolo de papel na mão. O ROSA MARIA tentou falar com a NCS e a câmara, mas sem êxito.
Alguns moradores elogiam: está melhor, mais activa e bonita, as pessoas convivem. Outros criticam: demasiado moderna, sem comida tradicional nem áreas públicas suficientes. Há tempos, puseram-se novos bancos, a música baixou e os moradores mai reticentes lá regressaram, apesar dos preços para turista. Numa praça tão multicultural, será difícil agradar a gregos e troianos, mas pode ser que à terceira seja de vez.
// História da Praça Martim Moniz
Pontos-chave da praça que homenageia o cavaleiro cristão que morreu entalado nas portas do castelo, em 1147, na reconquista de Lisboa aos Mouros.
1938 - Nasce o largo, com a demolição do palácio do Marquês do Alegrete.
1980 - Nesta década dá-se a primeira reabilitação, com o autarca Krus Abecasis, pai dos polémicos centros comerciais que ladeiam a praça. Seria concluída no mandato de Jorge Sampaio.
1990 - Década da segunda intervenção, sob o lema da Reconquista Cristã. Nasce o conceito de quiosques no mandato de João Soares – o autarca que, sobre o Centro Comercial Mouraria, chegou a dizer: “Vou implodi-lo”.
2012 - Inauguração do Mercado de Fusão, concessionado à NCS.
2017 - Transferência de concessão à empresa Moonbrigade Lda. por dívidas da antiga concessionária à Autarquia
2018 - Adenda ao contrato de concessão e alargamento do prazo por mais 14 anos.