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Entre tetos temporários, sem solução habitacional // Ricardo
Maria Ribeiro
2023
Entre tetos temporários, sem solução habitacional // Ricardo
Maria Ribeiro
2023
A crise habitacional é um tema fervente nos dias de hoje, atingindo grande parte da população portuguesa. Apesar de não ser recente a presença de pessoas sem abrigo nas ruas de Lisboa, é também inegável que com o aumento do custo de vida e a estagnação dos salários, temos assistido a um consequente aumento da percentagem de pessoas que vivem nesta condição.
Ricardo é uma das muitas pessoas em busca de uma solução habitacional, e depois de algum tempo a viver entre soluções temporárias, encontra-se agora à beira de ser despejado do quarto onde tem residido nos últimos meses, na zona de Santa Apolónia, sem nenhuma solução à vista. Ricardo é um dos muitos presos neste ciclo: sem trabalho e sem rendimentos, sobrevive com o rendimento social de inserção e do apoio que recebe da Santa Casa da Misericórdia, principalmente ao nível da alimentação. Sem rede de apoio familiar, não tem possibilidade de pagar uma renda no valor em que estas são praticadas atualmente em Lisboa, encontrando-se na iminência de regressar às ruas, onde já viveu em outros momentos da sua vida.
Ricardo tem 42 anos, nasceu e cresceu em São Vicente, em Lisboa, e passou muito tempo da sua infância e juventude por entre os bairros históricos da cidade, incluindo o bairro da Mouraria. Da sua infância lembra com carinho as refeições que a avó lhe preparava, destacando a massa com carne e o caldo verde, que faziam parte da ementa regular. A sua família tinha algumas dificuldades económicas, por isso Ricardo nunca soube o que era viver na abundância, começando relativamente cedo a trabalhar para se conseguir sustentar, bem como ajudar os seus pais e irmãs. Em algum momento da sua vida cortou relações com os seus pais, mencionando várias vezes que estes o tinham abandonado, e com as irmãs fala apenas esporadicamente, pelo seu aniversário ou pelo delas. Sem especificar muito, Ricardo revelou apenas que tinha uma doença mental e que numa fase em que se encontrava mais instável, cometeu alguns erros e isso acabou por afastar a sua família. Atualmente, conta apenas consigo próprio e com alguns amigos, mencionando em vários momentos da nossa conversa e de forma emocionada, o quanto se sentia só e desamparado.
Ao longo da sua vida fez um pouco de tudo, esteve uns anos na tropa, trabalhou nas obras, na área da publicidade, e passou por vários trabalhos temporários. Durante um período largo da sua vida, levantava-se muitas vezes pelas 5h da manhã para ir trabalhar, regressando apenas ao final do dia, sendo que durante todo este tempo, sempre cumpriu com os seus descontos para a segurança social. Ricardo questiona frequentemente de que lhe valiam agora as suas contribuições ao longo dos anos pois não vê retorno nenhum, apenas o rendimento que recebe de 229€ mensais, com os quais não consegue garantir um teto, para além de ter de pagar também a sua medicação, sendo que parte desta não é comparticipada.
Ricardo não viveu sempre em Lisboa, há uns anos atrás decidiu emigrar para a Holanda à procura de melhores condições, mas revela de forma emocionada que as coisas não correram como esperava, acabando por passar dificuldades. Na Holanda teve de dormir na rua, passou muita fome, e por fim viu-se obrigado a recorrer à prostituição para sobreviver. Acabou por regressar a Portugal e instalou-se na Rua do Benformoso, no bairro da Mouraria, onde viveu durante cerca de oito anos, recebendo apoio da Junta de Freguesia ao nível da habitação, alimentação e transportes. Após uma divergência com o senhorio desta casa, foi obrigado a sair e foi direcionado pela Santa Casa da Misericórdia para uma pensão na Rua da Atalaia, porém, não pôde permanecer neste quarto mais do que dois dias. Desde aí que vai arranjando soluções temporárias, também com o apoio da Santa Casa, mas segundo Ricardo, a instituição apenas lhe concede uma credencial com a qual consegue pagar um quarto em determinados lugares identificados, sempre no valor de 40€ diários. Mesmo pedindo dinheiro nas ruas, Ricardo revela que nunca consegue arranjar este valor, sendo uma ajuda ineficaz para quem não tem rendimentos.
Ricardo encontra-se preso neste ciclo: sem rendimentos, não consegue pagar uma casa para viver, e sem uma casa e acesso a condições de higiene, alimentação, conforto e privacidade, também se torna difícil arranjar um trabalho. Ricardo é um de muitos, tendo ainda esta dificuldade acrescida de viver com uma doença mental, que para além de necessitar de acompanhamento e medicação, ambos com os seus custos, tem ainda consequências nas suas relações pessoais, sociais e profissionais. Apesar de tudo, diz acreditar no destino e no futuro, e que todas as dificuldades que já enfrentou o vão levar a um lugar melhor, pois Deus tem um plano para si, aguardando expectante o que está por vir.
Ricardo é uma das muitas pessoas em busca de uma solução habitacional, e depois de algum tempo a viver entre soluções temporárias, encontra-se agora à beira de ser despejado do quarto onde tem residido nos últimos meses, na zona de Santa Apolónia, sem nenhuma solução à vista. Ricardo é um dos muitos presos neste ciclo: sem trabalho e sem rendimentos, sobrevive com o rendimento social de inserção e do apoio que recebe da Santa Casa da Misericórdia, principalmente ao nível da alimentação. Sem rede de apoio familiar, não tem possibilidade de pagar uma renda no valor em que estas são praticadas atualmente em Lisboa, encontrando-se na iminência de regressar às ruas, onde já viveu em outros momentos da sua vida.
Ricardo tem 42 anos, nasceu e cresceu em São Vicente, em Lisboa, e passou muito tempo da sua infância e juventude por entre os bairros históricos da cidade, incluindo o bairro da Mouraria. Da sua infância lembra com carinho as refeições que a avó lhe preparava, destacando a massa com carne e o caldo verde, que faziam parte da ementa regular. A sua família tinha algumas dificuldades económicas, por isso Ricardo nunca soube o que era viver na abundância, começando relativamente cedo a trabalhar para se conseguir sustentar, bem como ajudar os seus pais e irmãs. Em algum momento da sua vida cortou relações com os seus pais, mencionando várias vezes que estes o tinham abandonado, e com as irmãs fala apenas esporadicamente, pelo seu aniversário ou pelo delas. Sem especificar muito, Ricardo revelou apenas que tinha uma doença mental e que numa fase em que se encontrava mais instável, cometeu alguns erros e isso acabou por afastar a sua família. Atualmente, conta apenas consigo próprio e com alguns amigos, mencionando em vários momentos da nossa conversa e de forma emocionada, o quanto se sentia só e desamparado.
Ao longo da sua vida fez um pouco de tudo, esteve uns anos na tropa, trabalhou nas obras, na área da publicidade, e passou por vários trabalhos temporários. Durante um período largo da sua vida, levantava-se muitas vezes pelas 5h da manhã para ir trabalhar, regressando apenas ao final do dia, sendo que durante todo este tempo, sempre cumpriu com os seus descontos para a segurança social. Ricardo questiona frequentemente de que lhe valiam agora as suas contribuições ao longo dos anos pois não vê retorno nenhum, apenas o rendimento que recebe de 229€ mensais, com os quais não consegue garantir um teto, para além de ter de pagar também a sua medicação, sendo que parte desta não é comparticipada.
Ricardo não viveu sempre em Lisboa, há uns anos atrás decidiu emigrar para a Holanda à procura de melhores condições, mas revela de forma emocionada que as coisas não correram como esperava, acabando por passar dificuldades. Na Holanda teve de dormir na rua, passou muita fome, e por fim viu-se obrigado a recorrer à prostituição para sobreviver. Acabou por regressar a Portugal e instalou-se na Rua do Benformoso, no bairro da Mouraria, onde viveu durante cerca de oito anos, recebendo apoio da Junta de Freguesia ao nível da habitação, alimentação e transportes. Após uma divergência com o senhorio desta casa, foi obrigado a sair e foi direcionado pela Santa Casa da Misericórdia para uma pensão na Rua da Atalaia, porém, não pôde permanecer neste quarto mais do que dois dias. Desde aí que vai arranjando soluções temporárias, também com o apoio da Santa Casa, mas segundo Ricardo, a instituição apenas lhe concede uma credencial com a qual consegue pagar um quarto em determinados lugares identificados, sempre no valor de 40€ diários. Mesmo pedindo dinheiro nas ruas, Ricardo revela que nunca consegue arranjar este valor, sendo uma ajuda ineficaz para quem não tem rendimentos.
“Onde é que eu arranjo 40€ por dia para conseguir pagar um quarto para dormir? É impossível, tenho de ir para a rua pedir e mesmo assim não faço esse dinheiro. É muito difícil. E quem é que dá esse dinheiro a uma pessoa para ela conseguir dormir? Ninguém é rico, ninguém me vai ajudar, e também não posso estar à espera e dependente destas ajudas. E sem conseguir uma casa, estando a dormir na rua, também é complicado arranjar trabalho, é um ciclo muito difícil e não sei como sair daqui.”
Ricardo encontra-se preso neste ciclo: sem rendimentos, não consegue pagar uma casa para viver, e sem uma casa e acesso a condições de higiene, alimentação, conforto e privacidade, também se torna difícil arranjar um trabalho. Ricardo é um de muitos, tendo ainda esta dificuldade acrescida de viver com uma doença mental, que para além de necessitar de acompanhamento e medicação, ambos com os seus custos, tem ainda consequências nas suas relações pessoais, sociais e profissionais. Apesar de tudo, diz acreditar no destino e no futuro, e que todas as dificuldades que já enfrentou o vão levar a um lugar melhor, pois Deus tem um plano para si, aguardando expectante o que está por vir.