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Emigrar
Feliciano Mendes Pereira
2015

Artigo retirado da edição 9 do Jornal Rosa Maria. Esta edição poderá ser consultada na íntegra aqui.


#históriasdomundo
#migração
#mundonamouraria

Emigrar
É preparar os pés
Para cavalgar o deambular do deserto
É estar pendente do mundo da indiferença
É, indubitavelmente, revestir a capa da tartaruga
Conter a erosão maligna das ondas
Madrugar, serpentear
Fui escravo sem dar conta
Salário incompatível
É sentir a nostalgia da minha aldeia
Bambadinca, Bissau
Onde festejam o dia do peixe-sapato na pacata
estrada colorida de memórias da guerra
Meu amigo Cirilo Nbaque
Emigrar é transbordar o Universo incerto
Cansei-me de caminhar
Resolvi regressar a Lisboa
Vi tudo igual:
O vai-vem da Rua Augusta
O Mosteiro dos Jerónimos
Os seus artifícios
Religioso, secular
Costa da Caparica
A ventania do emblemático
A frieza do Atlântico
A noitada na Baixa de Lisboa
Multiculturalidade
O paladar do vinho alentejano
Tejo, traz-me a liberdade de que tanto necessito
Da minha terra devastada pela força das armas químicas
Lisboa, cidade hospitaleira
Dá paz e confortabilidade.


Feliciano Mendes Pereira veio da Guiné-Bissau para Portugal há catorze anos. Esteve primeiro em Casal de Cambra, passou seis anos em Madrid e vive há três na Mouraria. O poema publicado foi escrito após a sua estadia em Madrid. Gosta que o seu lar seja um lugar histórico de Lisboa. Gosta de viver uma vida tranquila e que as pessoas que o rodeiam sejam afáveis. Sente-se bem recebido. Na Guiné, trabalhou dez anos como Observador Marítimo Especializado para o Ministério do Mar. “Dez anos de Atlântico, em barcos de pesca. Fiscalizava, mas também ajudava no trabalho.” Cá, já fez um pouco de tudo, principalmente na construção civil e na hotelaria. Mas o que o apaixona é a escrita. Percebeu isso ainda na Guiné, e fez um curso de Literatura Moderna pós-laboral. “Já gostava de escrever, mas quando percebi que era o que mexia mesmo comigo quis aprender mais.” Desde então tem enchido cadernos com os seus poemas. Escreveu também uma novela, que falta terminar. “É preciso dar-lhe a conclusão certa, e isso não é fácil.